William Blake, em The Marriage of Heaven and Hell, de
1790, explica em sua filosofia que temos no mundo os
contrários, como o bem e o mal, como a alma e o corpo. O
desenvolvimento está desenhado nesta dialética dos
contrários e o progresso depende disso.
Em Filosofia Clínica, no consultório, uma das ocupações
de um filósofo é esquadrinhar o modo como a pessoa está
no mundo quanto a determinadas questões; entre elas, a
Filosofia da Mente do indivíduo, que provavelmente é
única para cada um.
Próximo ao entendimento de Blake, temos o movimento dos
contrastes, das comparações, do ir e vir, das
polarizações e outras conformações que usualmente
aparecem em consultório pela maneira como cada pessoa
estrutura e organiza sua mente.
Béla Bartók é um entre muitos exemplos. O que temos em
Contrastes para clarineta, piano e violino, de 1938,
aquela busca apurada pela alteridade do som, é parte
disso. Também servem como exemplo aquelas dobras
vertiginosas no Concerto para violino, pujante.
Podemos considerar que quanto menos colocarmos os tons
intermediários, maior será o contraste. Ou será que
estes tons que aparecem no meio é que servem de empuxo e
carga para acentuar as extremidades?
É possível que prestando atenção a tais elementos se
chegue a considerações curiosas sobre a vida, a
existência, o mundo. Quem se estruturou existencialmente
como Blake e Bartók para vivências do cotidiano, pode
observar que muitos estão em uma curiosa faixa da
existência. Neste contexto que denominamos planeta
Terra, os querubins, anjos, criaturas sublimes,
conseguem transitar, aparentemente, não com a mesma
facilidade com que criaturas velhacas, decaídas e podres
do inferno também podem. Se vivêssemos um pouco mais
acima, na proximidade das nuvens, talvez as bestas e os
imundos não tivessem como chegar e viveríamos apenas a
delicadeza do violino de Bartók. Mas se vivêssemos um
pouco mais abaixo, teríamos somente o lado da punctura
do arco ferindo as quatro cordas do violino. Até o
silêncio se pronunciaria em barulhos.
Eis que é então nesta faixa existencial que os
indecentes e obscenos passeiam entre os bondosos e
sossegados. Quando faltam os tons intermediários,
podemos passar tão rapidamente de um elemento a outro
que a confusão se instala. É o que pode ocorrer quando a
paisagem bucólica é interrompida pelo estopim de uma
bomba. Céu e inferno transitando pela mesma faixa.
Mas poderíamos falar em contras te aqui? Ou já estamos
diante de uma mescla cuja combinação nos remete ao
Impressionismo, a combinações nas quais não temos mais
como conceber o contraste, mas sim a combinação? Em
Blake, em Bartók, há combinações, há também contrastes.
Temos inúmeras facetas nesta questão, algumas que pedem
tratados sobre o tema, pesquisas abertas sobre outros.
Um exemplo: contrastes que não levam a sínteses, que não
evoluem para além dos próprios contrastes. |